quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Conto de Terça - Em uma semana

Era como se naquele momento o mundo tivesse entrado em um modo bem lento. Digo isso, porque na minha cabeça passaram vários pensamentos: "Corre agora!", "Cuidado para não falar merda!", "Ele não esta falando com você!", "Finge que é surda e vaza daí".... Foi disso a pior. Mas eu só consegui baixar a vista e sorrir, morrendo de vergonha. Realmente não sabia o que dizer, nem o porque de eu estar sentindo tudo isso dentro de mim. Mas disse:

- Ah, é que esses dias foi uma correria.
- Devia ter deixado o Leo me dar ser número, a gente já tinha ganhado uns dias de papo. Agora vou ter que correr atrás do tempo perdido.
- Então vamos aproveitar o tempo que temos, 'tô' indo para casa, vamos comigo? - OOOOiiiii?! De onde saiu essa ideia? Senhor das meninas que não tem noção das coisas que dizem, de onde eu tirei isso? E se ele pensasse que eu realmente queria que ele fosse PARA a minha casa e não ATÉ a minha casa comigo...
- No caminho a gente pode parar e tomar um sorvete - tratei de emendar.

Ele sorriu e concordou.
Já estava caminhando em direção ao ponto de ônibus, só que ele tinha ido de carro e tinha estacionado sentido contrário ao do ponto. Nesse momento entrei em pânico por estar indo para o carro de um cara que eu não conhecia, mas foi passando em cada passo que  a gente dava, em cada assunto que ia surgindo e eu ia percebendo o quanto ele era um cara legal. Durante todo o trajeto da faculdade até em casa, com direito a parada na sorveteria, conversamos um milhão de coisas. Descobrimos que assistíamos as mesmas séries, que tínhamos gostos musicais completamente diferentes, e que ambos odiavam sorvete de flocos. Ele contou que tinha acabado de voltar de um intercâmbio na Califórnia, e confessei que tenho o sonho de ir morar um tempo por lá. Falamos sobre a vida de um modo geral e de como a gente tinha chegado ali onde a gente estava. Sabe quando você encontra um bom amigo que não vê a algum tempo e vocês vão colocar o papo em dia? Pronto! Me senti assim conversando com o Ricardo, só que esse tempo que a gente não se via era uma vida inteira.

Quando a gente chegou na porta da minha casa, ainda ficamos no carro conversando sobre as coisas da vida e com aquele papo de: como a gente nunca se conheceu antes? Eu não queria sair daquele carro, por mim passava mais o resto do dia falando sobre os nossos personagens de séries, das viagens loucas que cada um já fez, das aventuras com os amigos... Só que já era noite e eu precisava entrar em casa. Sabia que minha mãe não estava em casa, mas não tinha certeza se queria que ele entrasse. Então, resolvi me despedir e entrar sozinha mesmo. Agradeci a carona e a conversa boa, e enquanto eu descia do carro o Ricardo segurou minha mão e disse:

- Queria muito te beijar agora, sabia? Muito mesmo! Mas você tem cara daquelas meninas que depois que conseguem o que querem enjoam muito rápido. Hahahahaha. Então prefiro ter a oportunidade da gente se encontrar de novo, posso te encontrar de novo essa semana?
- HAHAHAHAHAHA. Ai Ricardo você é muito engraçadinho, sabia? Vou pensar se quero lhe encontrar essa semana, ou se já enjoei de você. Qualquer coisa te mando um whats.

Entrei em casa com uma paz tão grande no coração, um sorriso no canto da boca, extremamente feliz por tudo está acontecendo assim. Fiquei com "ódio" por ele não ter me beijado? Fiquei! Mas, ou contaram exatamente como ele fazia para ir me prendendo a ele, ou ele devia me conhecer de outras vidas. Se ele tivesse me beijado ali era muito provável que eu fosse ver ele mais algumas vezes e depois não quisesse saber mais. Sei disso porque esse era praticamente o enredo da minha vida: eu achava os caras bonitos, paquerávamos, ficávamos, eles se apegavam rápido demais e eu simplesmente tomava abuso deles.

Com o Ricardo eu estava sentindo uma coisa diferente. Os olhos dele me olhavam diferente, ele tinha os olhos pretos mais lindos que eu já vi. A pele morena dele que parecia combinar com a minha. Aquele sorriso, que me deixava feliz só de ver. Era diferente, eu não conhecia ele direito, mas parecia que conhecia desde sempre.

Não aguentei esperar muito tempo,e na cama antes de dormir mandei um boa noite para ele.

- Beca, não faz isso comigo.
Eu pensei que ia ter que esperar a semana inteira até você resolver me dar um 'oi'.
- rsrsrs. Deixa de fazer drama, que eu sei que é zuação sua. Só vim aqui para ressaltar que o Ted nunca deveria ter ficado com a Robin, e ponto final.
- Já vi que esse vai ser nosso dilema eterno. Mas é assim mesmo, conheço poucas pessoas que superaram o fim de "How I Meet Your Mother".
- Pelo visto a gente vai ter que assistir de novo para você perceber o quanto ela é fdp.

escrevendo... escrevendo...

- A gente? Juntos?

Senhor das pessoas que não tem um filtro entre o cérebro e os dedos... me ajuda! Calma. Primeiro preciso fechar a janela pra ele não escrever outra coisa e vê que eu tô aqui olhando pra tela sem saber o que escrever. Agora preciso pensar no que responder. Certo que eu não escrevi no sentido literal de juntos, mas a sugestão dele não me pareceu nada mal.

- Se a gente passar uma semana conversando e não se odiar daqui pra lá, eu topo.
- HAHAHAHAHAHA. Gostei que tenho somente uma semana pra fazer com que você não me odeie, depois disso...
- Bem então entraremos em uma disputa, porque tenho uma semana para fazer você me odiar!
- Challenge accepted.
- Boa noite! Preciso dormir, até amanhã.

Eu gostava de como nossas conversas seguiam, eu gostava do rumo que as coisas estavam tomando. Tinha medo que tudo desse errado? Tinha. Mas a verdade era que eu queria passar tanto tempo quanto fosse possível junto com ele.

Aquela semana que passou foi muito divertida, fiz tudo que eu sabia que os caras odiavam, mandava mensagem o tempo inteiro, depois sumia, chamei pra sair e passei hoooras me arrumando, e ele esperando na sala, levei ele para assistir os filmes mais melosos que estavam passando no cinema, e ainda teve um dia que fiz um drama enorme porque ele foi comprar refrigerante e me trouxe coca-cola. 

- Eu odeio coca-cola! Você não presta atenção em mim, eu já te disse isso.
- Beca, você nunca me disse que odiava coca-cola.
- Disse isso todas as vezes que a gente saiu, a partir do momento que eu nunca pedia coca.
- Sério, para, tô começando a acreditar nesse papel que tu tá fazendo de doida. Pode para, não vou te odiar em uma semana. Hoje é o última dia da primeira semana, e eu estou vencendo!

Ele tinha razão, essa era minha última cartada, e ele só fazia rir do meu papel de boba. O fato é que em uma semana querendo fazer com que ele me odiasse, eu vi ele todos os dias, saímos todos os dias. Eu estava me acostumando com aquilo e hoje era a prova final dele. Iríamos sair com meus amigos, e as meninas iriam baixar a ficha e analisar ele de cabo a rabo. Fomos para o barzinho que sempre íamos, era central e perto da casa de todo mundo. Foi uma noite de risadas e conversas aleatórias. No final da noite, antes do Ricardo ir me deixar em casa, as meninas deram o parecer delas. Elas adoraram ele, exceto pelo fato de eu praticamente ter sumido por uma semana.Conversamos as besteiras de sempre e nos atualizamos sobre as novidades. Era hora de ir pra casa.

O Ricardo estacionou na porta da minha casa. A gente ainda não tinha se beijado e eu estava bem certa que isso iria acontecer neste momento.

- Beca, tenho uma coisa pra te pedir...

Sério, que depois dessa semana massa ele ia pedir pra me beijar? Não tô acreditando nisso, quando chega num ponto desse, beijo não se pede, beijo se dá.

- Não olha pra mim assim Beca, eu já estou utilizando toda a minha reserva de concentração para não começar a gaguejar aqui...
- hahahahahahahaha, fala. - já sabia que vinha alguma piada sem graça, que eu ia morrer de rir.

Silêncio. Comecei a ficar meio preocupada, meio sem graça, meio com vontade de cair na gargalhada.

- Beca... quer namorar comigo?

Oi?!

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